Feirante, sorveteiro, carreteiro, empacotador, engraxate e ajudante de mecânico. Ângelo Márcio da Silva trabalhou em todas estas profissões após sentir a dificuldade da mãe, Antônia Pinheiro da Silva, natural de Vitória da Conquista (BA), para criar 4 filhos sozinha, depois de se separar do pai deles, Mário da Silva, nascido em Cansanção, no mesmo Estado. Assim, ele garantia o seu pão com mortadela acompanhado de uma ‘Baré-Cola’ para beber com os amigos de infância, no bairro de Santo Amaro, na capital paulista.
Mas a vida o desafiou outra vez. A mãe de Ângelo faleceu em agosto de 1986, quando ele tinha apenas 13 anos. Sendo o terceiro dos 4 filhos, se uniu aos irmãos, e continuaram seus caminhos sem o apoio do pai, que seguiu com outra família após a separação.
No ano seguinte, em 1987, época em que cursava do 5º ano do ensino fundamental, no Colégio Elyo Ferreira de Castro no bairro Figueira Grande, “um anjo em forma de professor” – conforme relata Ângelo, chamado Valter Moreira, comentou com os alunos durante a aula de matemática, que o Tribunal de Contas do Município de São Paulo (TCMSP) estava com processo seletivo aberto para vagas de mensageiro/office-boy, cargo equivalente ao que hoje se conhece por jovem aprendiz. Ângelo Márcio agarrou a oportunidade com unhas e dentes.
Junto de outros garotos de sua idade, Ângelo fez a prova de conhecimentos gerais exigida pelo Tribunal e conseguiu ser aprovado entre as três vagas disponíveis. As ligações diárias via orelhão para a funcionária da seção de pessoal, Kátia, eram tantas, que ela já sabia quando era ele ao telefone. A ansiedade para ter um emprego fixo numa época tão difícil da vida tinha seus motivos e razões. “Às vezes eu costumo dizer que o tribunal foi o meu pai e minha mãe, meu pré-primário, foi tudo”, afirmou ele.
A imensidão do edifício-sede do TCMSP deixava tonto o menino de Santo Amaro que subia a rampa do Tribunal de Contas do Município pela primeira vez, em 6 de julho de 1987. Recebeu um treinamento introdutório no RH que, na época, funcionava no Anexo 1. Logo após, Ângelo começou a trabalhar no segundo andar, como assistente no Plenário, sob a chefia de Zulmira Leite e Olímpio Pereira dos Santos.
Encarregado de entregar jornais e correspondências, ao longo do tempo, Ângelo Márcio já conhecia o nome de todos os funcionários. “Era uma coisa comum as pessoas receberem correspondência aqui no TCMSP. Contas, informativos, revistas, porque a pessoa passava o tempo todo aqui, então vinha tudo para cá. No fim da tarde, eu ia na portaria, pegava um calhamaço de correspondências, e ia separando por setores, andares, e saia entregando,” relata o atualmente único funcionário no regime de Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) do TCMSP.
Entre os jovens mensageiros era comum o famoso “trote”. O uniforme de camisa social e calça cinza fazia parte da alta exigência do Tribunal em relação à roupa dos funcionários. Sendo assim, Ângelo conta que a brincadeira era dar nós nas roupas do mensageiro que deixava o shaft (alojamento ao lado dos elevadores), assim, o funcionário era obrigado a pedir um uniforme emprestado ou então voltar para casa, pois era proibido trabalhar sem estar uniformizado.
Ainda como mensageiro, Ângelo Márcio passou a substituir as férias dos chamados contínuos, que na prática eram mensageiros dos gabinetes, na Subsecretaria Administrativa e Secretaria Geral. Depois de um tempo, entrou para a reprografia, um setor subordinado à Biblioteca, para compor o time de Ademir Nogueira e José Carlos Ferraz. Chefiado por Lúcia Marlene, recebeu o acolhimento carinhoso da equipe composta por Lourdes Zsabo, Olivia Pereira, Gleize e Cleuza Oliveira.
Depois de um tempo, surgiu o convite para trabalhar na Secretaria Geral, antiga SDG, dentro do setor de telecomunicações, como operador de telex, telégrafos e fax, sendo chefiado por Vera Lúcia Marchise e supervisionado por Sebastião Carlos do Nascimento. “Tudo que era telegrama que o tribunal encaminhava a gente enviava por aquele setor para outros órgãos, outros conselheiros, outras autoridades do Brasil e até do exterior. Era uma ponte do tribunal com todos os outros órgãos”.
Por boa coincidência do destino, e após muito incentivo de seus chefes, Ângelo escolheu cursar Tecnologia da Informação (TI) na Faculdade Ítalo-Brasileira, justamente na época em que o setor de informática do TCMSP estava em plena ascensão. Assim, surgiu mais uma oportunidade para ele dentro do Tribunal. Com o apoio do então secretário geral, João Alberto Guedes, Ângelo foi recebido na então Secretaria de Informática pelo chefe Milton Hidemi Chigashi e pelo colega Estevan Gomes Camargo.
A princípio, Ângelo Márcio começou colaborando na área de desenvolvimento, ligada ao software, para alimentar um banco de dados, mas depois se encontrou com mais facilidade na área de suporte, com montagem e configuração de equipamentos, ligada ao hardware, em que aprendeu muito com a equipe formada pelo coordenador Marcos Welsh Carboni, Gilson I. Batista Pinto e Antônio Carlos da Silva Filho.
Trabalhando nesta área, Ângelo pôde acompanhar todo o processo de digitalização do Tribunal de Contas. “Eu vi isso nascer no Tribunal, cabeamento estruturado, conexões de rede, participei da infraestrutura disso, e a gente foi trocando pela tecnologia que estava cada vez mais presente e fomos atualizando até chegar no ponto de entregar as redes Wi-Fi”, contou o funcionário.
E assim se passaram 18 anos no setor de Informática, presenciando toda a modernização do Tribunal de Contas do Município, se adaptando para o mundo digital. “O Diário Oficial, todos os setores recebiam o exemplar, era folhetim na época, hoje é tudo digital, com a tecnologia tudo foi ganhando outras formas, o papel acabou ficando uma coisa obsoleta, tudo foi informatizado”, relatou Ângelo.
Com a chegada de novos funcionários para área de TI, Ângelo aproveitou uma nova oportunidade dentro do TCMSP e entrou para a equipe de Infraestrutura e Conservação: “é um setor que eu sempre tive curiosidade de trabalhar, que é infraestrutura predial, que envolve hidráulica, elétrica, alvenaria, jardim…”, contou. Esta mudança ocorreu em 2016, sob a supervisão de Édson Siqueira, e atualmente sob o comando de Felipe Rangel, e é neste setor que ele pretende se aposentar.
Nesse meio tempo de 35 anos de Tribunal, Ângelo teve três casamentos, dois filhos, Vinicius, de 22 anos, e Maryêva, de 14 anos, além de uma enteada, Yasmin, de 11 anos e Felipe, de 18, com a atual esposa, Josie Sobrinho.O servidor deseja registrar o seu agradecimento à antiga creche Padre Gregório Westrupp, onde Vinicius e Maryêva passaram a primeira infância, o mais velho na gestão de Delma Assar e a mais nova, de Barbara Popp, falecida recentemente.
Atualmente ocupado no cargo de Auxiliar de Serviços Administrativos, ele relembra a paisagem que contemplava quando trabalhava no segundo andar do TCMSP: “Era uma visão privilegiada da Avenida 23 de Maio, antes essas árvores não eram tão altas, e não havia essa selva de concreto que está subindo hoje. O trânsito também mudou, os carros eram Gol, Brasília, Opala, e agora tem uma infinidade de marcas, têm algumas que a gente até desconhece”.
Por fim, Ângelo relembra com gratidão o acolhimento generoso que recebeu dos funcionários do TCMSP na época em que ele tinha apenas 14 anos, era órfão de mãe e sofria com a ausência do pai: “o Tribunal sempre acolheu as pessoas, meus superiores e até amigos, sempre como boas influências e me deu suporte em tudo que eu precisei”. Em especial, ele cita ex-funcionários já aposentados, como Josefina Pires, Abelardo Manoel, Raimundo Moraes Gonçalves e Antônio Soares Machado Júnior, que o abraçaram como uma família.
Lilian Brito